Estilo espalha-se por casas de shows e baladas na cidade. Festival com novos ídolos espera reunir 40 000 pessoas na Chácara do Jockey
Quando chega o segundo semestre, o paulistano já sabe: vem por aí uma enxurrada de shows com astros internacionais. Uma das explicações para esse fenômeno é a queda da temperatura no Hemisfério Norte, época em que o ritmo de apresentações diminui na Europa e nos Estados Unidos. Tal qual as aves migratórias, os gringos transferem suas turnês para esta parte do planeta. Até o fim do ano pintam por aqui o ex-beatle Paul McCartney, a estelar banda americana The Black Eyed Peas e o rapper Eminem. No meio dos nomões de fora, surge um estranho no ninho na programação. Em vez de rock, pop e eletrônico, um grande evento aposta em ídolos do sertanejo universitário para juntar 20000 pessoas por dia. No sábado (23) e no domingo (24), a Chácara do Jockey Club, no Butantã — que já recebeu atrações como o grupo Radiohead e o cantor Sting —, hospeda o Sertanejo Pop Festival. Orçado em 3 milhões de reais, o evento vai reunir dezesseis atrações, com ingressos que variam de
Neto das modas de viola de tema caipira, cuja época dourada ocorreu entre os anos 1930 e 1950, o sertanejo universitário tem arrastado jovens a shows e casas noturnas, fazendo a alegria das gravadoras. A Som Livre, por exemplo, tem quinze desses artistas em seu portfólio e vendeu meio milhão de discos nos últimos doze meses. O ritmo atual quase não traz mais no DNA a herança caipira (ainda que influenciada pelo country e pela música romântica) dos antecessores, como Leandro & Leonardo, Zezé Di Camargo & Luciano e Chitãozinho & Xororó. Tem um andamento mais acelerado, percussão incrementada e guitarras bem mais barulhentas. Ou seja: trilha sonora para pular e paquerar. Jovens da classe média alta, que chegam de carrão importado à noitada e gastam centenas de reais entre o ingresso e as bebidas, aprovaram. E o brega virou pop.
São expoentes desse estilo Victor & Leo, Fernando & Sorocaba e Jorge & Mateus. Raro artista em carreira-solo num universo famoso pelas duplas, Luan Santana tem no repertório um hit chamado ‘Meteoro’ — uma metáfora de sua ascensão. Aos 19 anos, o sul-mato-grossense faz 25 shows mensais. Já vendeu 120 000 DVDs e 180 000 CDs. Seu aparato é transportado por duas carretas e dois ônibus. Enquanto isso, ele segue de jatinho Brasil afora. Em dezembro, Luan anima um cruzeiro marítimo, coisa de artistas tarimbados como Roberto Carlos. Dois anos atrás, as cifras eram menos impressionantes. O músico saiu de Campo Grande, sua cidade natal, para tocar num palco secundário na Festa do Peão de Boiadeiro de Barretos. Investiu 3 000 reais na empreitada e distribuiu 3 000 CDs na ocasião. Em agosto deste ano, voltaria ao evento com um cachê de 300 000 reais. “A primeira coisa que passou na minha cabeça foi: ‘Como antes não conheciam as minhas músicas e, dois anos depois, 200 000 pessoas cantavam junto comigo?’ ”, diz Luan.
Compositor de ‘Meteoro’, Fernando Fakri de Assis, o Sorocaba da dupla Fernando & Sorocaba, atribui o estouro ao novo “papo” proposto pela turma. “O sertanejo teve fases: esta é mais urbana, jovem, traz mais gíria. E não deixa de ser uma porta de entrada para conhecer os antigos.” Paulistano criado na cidade que lhe rendeu o apelido, o músico faz com seu parceiro uma média de vinte a 25 shows por mês. “Nosso som está entrando até no Rio de Janeiro”, conta. “E olha que é difícil falar de carroça e charrete para o pessoal que vive na praia.”
Segundo os apreciadores, a pecha de cafona ficou no passado. Entre a crítica e o meio artístico, contudo, não há consenso. “Universitário ou não, esse tipo de música é muito brega, ultracomercial”, considera Lauro Lisboa Garcia, crítico e repórter especializado em música brasileira do jornal ‘O Estado de S. Paulo’. “Não vejo diferença entre o ‘breganejo’ de Leonardo, Daniel e Zezé Di Camargo & Luciano e esses novos. É o mesmo padrão de letras pobres, arranjos repetitivos, vozes estridentes e gemidos que doem no ouvido.” Autor do clássico ‘Romaria’, sucesso na voz de Elis Regina, o cantor e compositor Renato Teixeira discorda: “Para atingir o nível poético de um Vinicius, um Chico ou um Caymmi, falta estrada, mas vamos chegar lá. Uma geração aperfeiçoa a outra”. Chitãozinho, tido como professor pela moçada, reforça. “Lá atrás, sofremos preconceito, pois o pessoal da cidade grande não estava habituado a nossa música. Felizmente, conseguimos quebrar essa resistência”, afirma. “Os novos não escutaram o que a gente escutava e não têm a obrigação de falar dos assuntos caipiras.”
O sertanejo universitário tem se mostrado um ótimo negócio para as casas de shows. “Não chega a ser como o público de jazz e blues, que toma muito uísque e prosecco, mas a plateia consome mais do que a de rock”, calcula Elvis Patez, programador artístico do HSBC Brasil, local que abrigou quinze eventos do gênero, entre fechados e com venda de ingressos, em 2009 e
Esse mesmo público que se amontoa em grandes shows também lota baladas do gênero durante toda a semana
Um dos primeiros projetos do tipo a tomar espaço em bares nos quais se ouviam apenas outros ritmos, como o pop e o eletrônico, o Terçanejo faz o refrão chiclete das músicas ecoar no coração da Vila Olímpia há dois anos. A noite, criada pelas sócias Juliana Barbeiro e Vanessa Buck, ocorre todas as terças no bar Cortez e recebe um público jovem, composto basicamente de estudantes universitários. Sem nenhum sinal de passinhos coreografados, garotas e garotos se agrupam e cantam em estridentes notas as músicas apresentadas. “Nomes conhecidos já cantaram aqui, mas a maioria está em início de carreira e nos procura para conseguir espaço”, afirma a ex-relações-públicas Juliana. Estudantes de odontologia, as irmãs Isabela e Carolina Miarelli cantavam na pista, sem errar uma palavra, sucessos como ‘Ei, Psiu, Beijo Me Liga’, da dupla João Bosco & Vinícius, e ‘Tá Se Achando’, de Guilherme & Santiago. “Somos de Minas Gerais, gostamos de sertanejo desde pequenas”, diz Isabela.
A onda ganhou um dia especial no Cafe de
Fonte: Veja São Paulo
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